São Bento do Sul
A Juíza de direito, Liliane Midori Yshiba Michels, suspendeu o Edital de Concorrência, que tinha como objetivo a concessão de serviço funerário do Município de São Bento do Sul. O agravo de instrumento por parte da prefeitura, também teve seu pedido indeferido.
Senão Vejamos:
“MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5002134-23.2022.8.24.0058/SC
IMPETRANTE: FUNERARIA CAMPO DO TENENTE LTDA
IMPETRADO: SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO - MUNICÍPIO DE SÃO BENTO DO SUL/SC - SÃO BENTO DO SUL
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Funerária Campo do Tenente Ltda em face de ato praticado pelo Secretário Municipal de Administração do Município de São Bento do Sul/SC.
Aduziu a impetrante, em apertada síntese, que o Município de São Bento do Sul tornou público o Edital de Concorrência de n. 175/2021, que possui por objeto "a outorga de concessão de serviço funerário do Município de São Bento do Sul/SC".
Nesse contexto, narrou que há inúmeras inconsistências e contradições no Edital, as quais já foram objeto de esclarecimentos e alterações, ensejando no adiamento do certame. Nada obstante, arguiu que, apesar das alterações, persistem incorreções que representam violação aos princípios da ampla concorrência e da competitividade, assim como da impessoalidade, da isonomia, da segurança jurídica, dentre outros.
Somado a isso, sustentou que, nada obstante os fundamentos expostos pelo Município para rejeitar a impugnação interposta pela impetrante em seara administrativa, os atos praticados pelo impetrado extrapolam os limites da discricionaridade e ferem a supremacia do interesse público, o que vai de encontro ao objetivo do procedimento licitatório.
Assim, pleiteou pela concessão de medida liminar inaudita altera pars, com o intuito de determinar-se a imediata suspensão do Edital de Concorrência de n. 175/2021, que possui data de abertura marcada para o dia 28/03/2022, às 9:00 horas.
É o breve relato.
Vieram os autos conclusos.
Passo a decidir.
O artigo 7º, inciso III, da Lei n. 12.016/09, dispõe que:
Art. 7º. Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
[...] III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.
Assim, para a concessão da liminar são necessários dois requisitos: (1) relevância dos motivos em que se assenta o pedido na inicial; e (2) possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito (fumus boni juris e periculum in mora).
Em relação ao primeiro requisito, em sede de cognição sumária, verifico, em análise ao cotejo probatório, que há probabilidade do direito da impetrante, ao menos no que toca às irregularidades e à ilicitude do processo licitatório.
Digo isso porque, do que consta da documentação apresentada com a prefacial do presente writ, é possível constatar inúmeras incoerências entre o Edital de Concorrência de n. 175/2021 e a Matriz de Riscos, a saber: a) divergência entre o número de colaboradores exigidos para a prestação do serviço, uma vez que o Edital exige a contratação de 2 agentes funerários, 1 gerente e 1 tanatopraxista (ev. 1, EDITAL4, p. 24, alínea 19.4.1.7), ao passo que a Matriz de Riscos dispõe que são necessários 6 agentes funerários, 2 tanatopraxistas e 2 gerentes, compondo 3 equipes (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 6); e b) diferença entre o número de veículos exigidos para a prestação do serviço, haja vista que o Edital exige ao menos 2 veículos (ev. 1, EDITAL4, p. 24, alínea 19.4.1.6), enquanto a Matriz de Riscos dispõe sobre no mínimo 3 automóveis (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 8).
Na sequência, também é possível observar incorreções quanto aos cálculos do quadro de investimentos totais (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 8); inobservância quanto aos reajustes dos custos relativos às urnas, que não consideraram o prazo de vigência da concessão do serviço funerário, qual seja, 20 anos (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 31); assim como imprecisões no que tange ao custo com pessoal, mormente porque considera uma unidade de pessoal e de serviço (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 11).
Tais circunstâncias, consoante bem apontado pela empresa impetrante, inviabilizam a composição dos custos e a formulação das propostas pelos participantes do certame, ferindo premissas básicas de transparência e segurança jurídica.
Como se não bastasse, consta nos itens 9.2 e 9.3 do Edital de Concorrência de n. 175/2021 a previsão de outorga mínima e outorga adicional (ev. 1, EDITAL4, p. 13), in verbis:
[...] 9.2 O pagamento do Valor da Outorga Mínima é de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), que compreende: R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), pago na data de assinatura do Contrato de Concessão, e o saldo remanescente deverá ser pago em 19 (dezenove) parcelas anuais e sucessivas, cujo pagamento deverá ser efetuado no 10º (décimo) dia útil do mês de janeiro.
9.3 O pagamento do Valor da Outorga Adicional, que deverá ser efetuado 1 (uma) parcela no ato da assinatura do Contrato de Concessão.
A supracitada previsão, em meu sentir, afronta os princípios da competitividade, da livre concorrência, da impessoalidade e da isonomia, mormente porque exige relevante capacidade econômica das pessoas jurídicas concorrentes, em detrimento de microempresas e empresas de pequeno porte.
Portanto, tenho que a recusa da autoridade coatora em alterar a Cláusula 9.3 do Edital de Concorrência, objeto de discussão, viola os princípios fundamentais relativos à licitação, citados alhures, bem como fere disposição expressa na Lei Federal n. 8.666/1993, que em seu art. 3º, inciso I, determina que é vedado aos agentes públicos "admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato".
Além disso, é clara a violação aos princípios da isonomia, impessoalidade, seleção da proposta mais vantajosa e julgamento objetivo.
Há, portanto, fumus boni iuris.
Na sequência, pontuo que o periculum in mora é latente no presente caso, uma vez que a falta da liminar acarretará na realização final do objeto do processo licitatório, tornando inócua a pretensão.
Logo, cumpre deferir a liminar para suspender o processo licitatório.
Todavia, saliento que nesta análise perfunctória do direito da impetrante não se está a dizer que a impetrante possui o direito subjetivo à classificação, mas sim que há elementos suficientes para a concessão da medida liminar, a qual consiste na suspensão do procedimento licitatório e dos atos dele decorrentes.
Sobre o tema, aliás, é o entendimento jurisprudencial:
REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. CONCORRÊNCIA. MELHOR TÉCNICA E PREÇO. SERVIÇOS DE MEDIÇÃO DE CONSUMO DE ÁGUA E ESGOTO, DE FATURAMENTO, COM FORNECIMENTO DE PROGRAMA DE COMPUTADOR ESPECÍFICO, E DE "CALL CENTER". DIVERSIDADE DAS TAREFAS E VEDAÇÃO À FORMAÇÃO DE CONSÓRCIOS QUE FAVORECE UNICAMENTE A PRESTADORA ATUAL DO SERVIÇO. EDITAL, ALIÁS, QUE PREVÊ CONDIÇÕES E PRAZOS RESTRITOS, INVIABILIZANDO A PARTICIPAÇÃO DE OUTRAS CONCORRENTES, MORMENTE SE A TÉCNICA É PRESTIGIADA EM DETRIMENTO DO PREÇO. VIOLAÇÃO MANIFESTA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA IMPESSOALIDADE. ARTIGOS 37, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E 3º DA LEI N. 8.666, DE 21.6.1993. ANULAÇÃO DO EDITAL. PROVIDÊNCIA QUE SE IMPUNHA. SENTENÇA CONFIRMADA. A prestação continuada e eficiente do serviço público é o objetivo perseguido pelo Administrador Público quando se propõe a realizar o processo de licitação. Mas, para atingi-lo, não se admite o direcionamento do certame que resulte na escolha de uma determinada concorrente, ainda mais se as licitantes preteridas poderiam proporcionar condições mais vantajosas à Administração Pública. (TJSC, Reexame Necessário em Mandado de Segurança n. 2008.052705-0, de Joinville, rel. Jânio Machado, Quarta Câmara de Direito Público, j. 11-12-2008). (grifos nossos)
Ante o exposto, defiro o pedido liminar, nos moldes do artigo 7º, inciso III, da Lei 12.016/09, para determinar a suspensão imediata do processo licitatório regido pelo Edital de Concorrência de n. 175/2021 e de todos os atos dele decorrentes até o julgamento do presente Mandado de Segurança.
Notifique-se, com urgência, a autoridade coatora acerca da presente decisão e para que preste pessoalmente as informações pertinentes, no prazo de 10 (dez) dias.
Além disso, nos termos do art. 7º, inciso II, da Lei 12.016/09, dê-se ciência, também com urgência, ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito.
Por fim, intime-se o Ministério Público para manifestação no prazo de 10 (dez) dias (art. 12 da Lei 12.016/2009).
Cumpra-se com urgência.
Fica o Oficial de Justiça plantonista autorizado a notificar e a intimar a autoridade coatora e a pessoa jurídica interessada por telefone, por e-mail ou pelo aplicativo meio eletrônico de comunicação, consoante autorização constante na Circular n. 76, de 25 de março de 2020, da Corregedoria-Geral da Justiça de Santa Catarina, devendo certificar detalhadamente nos autos a forma como procedeu a diligência.
Após, conclusos para sentença.
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Documento eletrônico assinado por LILIANE MIDORI YSHIBA MICHELS, Juíza de Direito, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc1g.tjsc.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, mediante o preenchimento do código verificador 310025777526v27 e do código CRC 8f168acd.”
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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5015883-87.2022.8.24.0000/SC
AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SÃO BENTO DO SUL/SC
AGRAVADO: FUNERARIA CAMPO DO TENENTE LTDA
AGRAVADO: SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO - MUNICÍPIO DE SÃO BENTO DO SUL/SC - SÃO BENTO DO SUL
DESPACHO/DECISÃO
Município de São Bento do Sul/SC interpôs recurso de agravo de instrumento da decisão proferida pela Juíza de Direito da 1ª Vara da Comarca de São Bento do Sul que, nos autos de "mandado de segurança" n. 5002134-23.2022.8.2.0058 impetrado pela Funerária Campo do Tenente Ltda., deferiu o pedido liminar para suspender o processo licitatório regido pelo Edital de Concorrência de n. 175/2021 até o julgamento do presente Mandado de Segurança.
Defende, em síntese, o desacerto da decisão agravada uma vez que "os fatos que fundamentam o writ são os mesmos, a causa de pedir é idêntica e o próprio pedido, das razões de impugnações e recursos administrativos, dos quais houveram as devidas reformulações quando de fato serviam ao maior número de participantes e não somente ao exclusivo interesse da impetrante. A argumentação apresentada pelo impetrante não traduz a inarredável relevância a que diz respeito à lisura dos serviços funerários prestados e as inúmeras prorrogações de permissão e daqueles por ela beneficiados" (evento 1, Petição Inicial 1, p. 5).
Afirma que "ao contrário do que alega a impetrante, inexiste direito subjetivo, os Princípios da Ampliação da Competitividade, da Impessoalidade, da Isonomia, entre outros, encontram-se devidamente salvaguardados em todos os termos do Edital de Concorrência Pública Nº 175/2021 – pelo que em procedimento administrativo houve a sua republicação, visto que cada um dos questionamentos formulados pela impetrante foram esclarecidos com a necessária coerência e transparência, além de fazê-lo dentro do prazo legal" (evento 1, Petição Inicial 1, p. 5-6).
Requer, portanto, a atribuição do efeito suspensivo, para permitir o prosseguimento do processo licitatório regido pelo Edital de Concorrência de n. 175/2021, com abertura prevista para 28-03-2022.
É o relatório.
Decido.
O recurso merece ser conhecido, porquanto tempestivo, dispensado do preparo e previsto no art. 1.015, inciso I, do CPC, por serem os autos na origem eletrônicos, a agravante está desobrigado de instruí-lo com os documentos relacionados no art. 1.017, incisos I e II, do CPC/2015, a teor do § 5º do mesmo dispositivo legal.
O pedido de tutela de urgência em agravo de instrumento encontra amparo no inciso I do artigo 1.019 e no artigo 995, ambos do CPC, que dispõem:
Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:
I poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; [...].
Art. 995. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Acerca dos requisitos necessários para a atribuição de efeito suspensivo ao recurso ou concessão de antecipação da tutela recursal, transcrevo as lições de Cristiano Imhof:
Este inciso I do novo CPC, repete, na íntegra, a redação do artigo 527, inciso III, do CPC/1973. Portanto, o relator continuará podendo atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão. Para a atribuição de efeito suspensivo ao recurso ou o deferimento de antecipação de tutela, total ou parcialmente, da pretensão recursal (inciso I), os requisitos são aqueles elencados nos artigos 995, parágrafo único e 1.012, parágrafo 4º, ou seja, deve o agravante, cumulativamente demonstrar que na imediata produção dos efeitos da decisão objurgada, há risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e a probabilidade de provimento do recurso (Novo código de processo civil Comentado. São Paulo: BookLaw, 2016, p. 1495 e 1496).
Por evidente que, em se tratando de tutela de urgência, há que se observar os pressupostos legais inseridos no artigo 300 do CPC, norma geral aplicável também em sede recursal: "A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".
A esse respeito, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero lecionam:
A suspensão da decisão recorrida por força de decisão judicial está subordinada à demonstração da probabilidade de provimento do recurso (probabilidade do direito alegado no recurso, o fumus boni iuris recursal) e do perigo na demora (periculum in mora). [...]. O que interessa para a concessão de efeito suspensivo, além da probabilidade de provimento recursal, é a existência de perigo na demora na obtenção do provimento recursal (Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 929).
Saliento que tais requisitos (probabilidade do direito e perigo na demora) são cumulativos, de modo que, na ausência de um deles, desnecessário perquirir a presença do outro (STJ, REsp n. 238.140/PE, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. em 6-12-2001).
Feitas essas considerações, mister se faz analisar a presença dos requisitos autorizadores à concessão da tutela antecipada recursal almejada.
In casu, muito embora as alegações da parte agravante, verifico que ela não logrou êxito em demonstrar o requisito da probabilidade do direito.
Sobre o tema, necessário destacar os regramentos previstos nos arts. 7º e 40 da Lei das Licitações (Lei n. 8.666/93), respectivamente:
Art. 7º As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência:
[...]
§ 2º As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando:
I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório;
II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários;
III - houver previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das obrigações decorrentes de obras ou serviços a serem executadas no exercício financeiro em curso, de acordo com o respectivo cronograma;
IV - o produto dela esperado estiver contemplado nas metas estabelecidas no Plano Plurianual de que trata o art. 165 da Constituição Federal, quando for o caso (grifei).
Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:
[...]
§ 2º Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante:
I - o projeto básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos;
II - demonstrativo do orçamento estimado em planilhas de quantitativos e custos unitários;
II - orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
III - a minuta do contrato a ser firmado entre a Administração e o licitante vencedor;
IV - as especificações complementares e as normas de execução pertinentes à licitação.
No caso dos autos, ao analisar a documentação apresentada na origem denoto que realmente há contradição entre o edital e a matriz de risco apresentados pelo Município agravante, e tais pontos foram bem analisados pela magistrada de origem, razão pela qual reitero seus fundamentos como forma de decidir:
Em relação ao primeiro requisito, em sede de cognição sumária, verifico, em análise ao cotejo probatório, que há probabilidade do direito da impetrante, ao menos no que toca às irregularidades e à ilicitude do processo licitatório.
Digo isso porque, do que consta da documentação apresentada com a prefacial do presente writ, é possível constatar inúmeras incoerências entre o Edital de Concorrência de n. 175/2021 e a Matriz de Riscos, a saber: a) divergência entre o número de colaboradores exigidos para a prestação do serviço, uma vez que o Edital exige a contratação de 2 agentes funerários, 1 gerente e 1 tanatopraxista (ev. 1, EDITAL4, p. 24, alínea 19.4.1.7), ao passo que a Matriz de Riscos dispõe que são necessários 6 agentes funerários, 2 tanatopraxistas e 2 gerentes, compondo 3 equipes (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 6); e b) diferença entre o número de veículos exigidos para a prestação do serviço, haja vista que o Edital exige ao menos 2 veículos (ev. 1, EDITAL4, p. 24, alínea 19.4.1.6), enquanto a Matriz de Riscos dispõe sobre no mínimo 3 automóveis (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 8).
Na sequência, também é possível observar incorreções quanto aos cálculos do quadro de investimentos totais (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 8); inobservância quanto aos reajustes dos custos relativos às urnas, que não consideraram o prazo de vigência da concessão do serviço funerário, qual seja, 20 anos (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 31); assim como imprecisões no que tange ao custo com pessoal, mormente porque considera uma unidade de pessoal e de serviço (ev. 1, DOCUMENTACAO9, p. 11).
Tais circunstâncias, consoante bem apontado pela empresa impetrante, inviabilizam a composição dos custos e a formulação das propostas pelos participantes do certame, ferindo premissas básicas de transparência e segurança jurídica.
Como se não bastasse, consta nos itens 9.2 e 9.3 do Edital de Concorrência de n. 175/2021 a previsão de outorga mínima e outorga adicional (ev. 1, EDITAL4, p. 13), in verbis:
[...] 9.2 O pagamento do Valor da Outorga Mínima é de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), que compreende: R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), pago na data de assinatura do Contrato de Concessão, e o saldo remanescente deverá ser pago em 19 (dezenove) parcelas anuais e sucessivas, cujo pagamento deverá ser efetuado no 10º (décimo) dia útil do mês de janeiro.
9.3 O pagamento do Valor da Outorga Adicional, que deverá ser efetuado 1 (uma) parcela no ato da assinatura do Contrato de Concessão.
A supracitada previsão, em meu sentir, afronta os princípios da competitividade, da livre concorrência, da impessoalidade e da isonomia, mormente porque exige relevante capacidade econômica das pessoas jurídicas concorrentes, em detrimento de microempresas e empresas de pequeno porte.
Portanto, tenho que a recusa da autoridade coatora em alterar a Cláusula 9.3 do Edital de Concorrência, objeto de discussão, viola os princípios fundamentais relativos à licitação, citados alhures, bem como fere disposição expressa na Lei Federal n. 8.666/1993, que em seu art. 3º, inciso I, determina que é vedado aos agentes públicos "admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato".
Além disso, é clara a violação aos princípios da isonomia, impessoalidade, seleção da proposta mais vantajosa e julgamento objetivo. [...].
Logo, ante constatação de contradição do estipulado no instrumento convocatório com a planilha de matriz de risco, além de contradição entre as próprias cláusulas do edital, por cautela, é de ser mantida a suspensão de sua abertura, nos termos do art. 7º, § 2º c/c 40, § 2º, ambos da Lei n. 8.666/93.
Registro que inexistindo a probabilidade do direito em favor da parte agravante não há que se perquirir a presença ou não do perigo da demora, pois, como já mencionado, os requisitos devem concorrer concomitantemente.
Por derradeiro, é de se consignar que a presente análise, realizada em sede cognição sumária, pode ser alterada no decorrer da regular instrução do processo na origem ou quando do exame final deste recurso pelo Órgão Colegiado.
Diante do exposto, INDEFIRO o pedido efeito suspensivo da decisão agravada.
Comunique-se ao juízo de origem.
Intime-se a empresa agravada para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do artigo 1.019, II, do Código de Processo Civil.
Decorrido, intime-se o representante do Ministério Público na forma do art. 1.019, III, do CPC.
Publique-se. Intime-se.
Documento eletrônico assinado por HAIDÉE DENISE GRIN, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2065968v18 e do código CRC e73678e1.
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